Índia: Tordi Sagar e a janela premiada

Parar no vilarejo de Tordi Sagar na Índia, nunca esteve nos meus planos, muito pelo contrário. Achei aquele tal de “Village Stay” (estadia numa vila) incluída de última hora no meu roteiro com uma cara tremenda de furada. Desdenhei, reclamei e por sorte me enganei.

Tordi Sagar é uma vila pequenina no Rajastão, não muito longe de Jaipur ou Pushkar, duas das mais visitadas cidades do estado, e para chegar lá foram cerca de 4 horinhas dentro de um jipe em pura estrada de terra. Sentada na janelinha fui observando a estrada, e o passar das pessoas, vi cenas incríveis, dezenas de vacas de chifres pintados de azul (que segundo nosso guia eram pura decoração), mulheres de saris decorados e cabeça coberta, pastoras com seu rebanho, homens de turbantes coloridos e motos com a “casa toda” equilibrada. Até ai, bacana, porém não muito diferente do que eu já  havia visto nas minhas andanças pelo país nos dez dias anteriores.

A caminho de Tordi Sagar…

Em algum lugar do Rajastão

Mulheres cobertas com seus saris coloridos

Moto-loja na Índia

Vendedor ambulante

Índia - Vendedor de Nozes

O Vendedor de Nozes

Índia -Mulheres do Rajastão

Mulheres do Rajastão

Índia - Pastora e ovelhas

Pastora e ovelhas

Índia: vacas de chifre azul

Vacas de chifre azul

Chegando em Tordi, recebemos as chaves do nosso quarto – aqui preciso parar para contar que esse era sempre um momento de suspense, depois de tantos quartos ruins e banheiros abaixo da crítica, estávamos particularmente preocupadas com o que nos esperava em Tordi, uma vila nada a ver, no meio do nada. Ao longo da viagem, desenvolvemos um ritual de abrir o quarto, checar lençóis e travesseiros (que nem sempre estavam limpos 🙁 – e não tô falando de encardido, tô falando de não lavado MESMO) e finalmente checar o banheiro, que na maioria das vezes era uma ingrata surpresa: ou estava sujo ou não tinha água quente.

Porta linda em Tordi Sagar

Porta linda em Tordi Sagar

Entramos no quarto, que estava numa completa escuridão. Ainda era de dia, e em Tordi, o gerador – ou seja, a luz – só funciona após as 18:00. Abrimos a pequena janela do lado esquerdo do quarto para arejar o ambiente e adivinhe só o que vimos: uma árvore linda e um festival de pardais (conhecedores de pássaro, entendam que com meu conhecimento profundo das espécies, tudo o que é verde e não é papagaio é automaticamente denominado de pardal. Se alguém ai souber o nome de verdade é só me avisar que eu atualizo o post com prazer ;)) lindos, verdes e saltitantes e um outro passarinho preto de mini penacho e rabinho com detalhe vermelho (pena que ele voou rapidinho e não voltou mais).

O primeiro a pousar na "nossa árvore".

O primeiro a pousar na “nossa árvore”.

Pardalzinho se coçando

Pardalzinho se coçando

Desfile de pardais

Desfile de pardais

Desencanei de analisar o quarto e investigar a precariedade do chuveiro e gastei uma boa meia hora observando os pássaros, cantando e pulando de um galho para o outro. Nesse meio tempo, vi e fotografei pardais e esquilos, feliz da vida de ter um quarto com janela de frente para a única grande árvore do terreno. Estava tão apaixonada pela árvore e suas possibilidades que passei a não achar Tordi algo tão ruim assim.

Casal beijoqueiro

Casal beijoqueiro

"O bonitão solitário" - Assim apelidamos o único pardal da turma que não se misturava

“O bonitão solitário” – Assim apelidamos o único pardal da turma que não se misturava

Algumas horas depois, fui a até a janela novamente para ver se os pardais ainda estavam alí, e quase caí para trás com o que vi. Uma coruja dessas brancas e gordinhas (Sabe a corujinha do Harry Potter?) com olhos grandes, amarelos e arregalados. Me segurei para não gritar de emoção.

Corujinha branca - tremi de emoção pra bater essa primeira foto

Corujinha branca – tremi de emoção pra bater essa primeira foto

A coruja me viu e ao invés de voar resolveu me encarar. Ficamos uns 5 minutos olhando uma para a outra, sem perder contato. Eu com medo que ela voasse, e ela sei lá do que tinha medo. Com muito cuidado e carinho, caminhei até o outro lado do quarto, peguei minha câmera e comecei a fotografar. A coruja foi tão gentil que mudou de lugar e depois ficou paradinha enquanto eu ajustava a câmera para fotografa-la da melhor forma possível. E eu, tremendo de emoção tratei de clica-lá uma, duas, três vezes.

Coruja branca me encarando

Coruja branca me encarando

Em seguida, tentando fazer o menor barulho possível, tratei de acordar a Fabi, minha companheira de quarto, que dormia sua siesta profunda e não entendeu porque eu a acordava em silêncio mandando-a ficar quieta e caminhar até a janela. A coruja esperou a chegada da Fabi quietinha e praticamente imóvel – com as duas ali paradas olhando pra ela, a bichinha não sabia bem quem encarar, olhou pra uma, olhou pra outra e segundos depois voltou a me encarar completamente, e eu agradeci o olhar com um sorriso. Jamais me esquecerei daquele olhar forte e preciso da coruja branca de Tordi Sagar, um dos momentos mais belos da viagem!

Tordi Sagar não foi uma furada e a aparição da corujinha branca foi apenas um tira gosto do que veríamos a seguir: cenas incríveis de uma Índia de verdade.

E você, alguma vez já teve uma janela premiada?

Este post faz parte da série Histórias de Viagem, um retrato fotográfico das minhas andanças pelo mundo.

 

 

 

mari vidigal
mari vidigal
Mari é editora do Ideias na Mala há 14 anos e mora na Califórnia. Já visitou dezenas de países e explorou boa parte dos Estados Unidos com seus filhos Tom e Caio. Sua paixão? Viajar com o motorhome Rocky e colecionar Springs na Flórida. Mari é conhecida pelos seus roteiros super completos dos principais destinos da Europa (sim! Tem roteiro de Paris, Madri, Londres, Portugal e Amsterdam) e pelo conteúdo mais completo da Califórnia, Flórida e Las Vegas entre os sites de viagem do Brasil. Em 2021 recebeu o prêmio IPW Travel Awards, um dos maiores prêmios de jornalismo de viagem, e em 2024 foi finalista do prêmio Europa de Comunicação.

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